segunda-feira, 1 de abril de 2013

PARTE I: Quem ocupará o cargo de Procurador-Geral da República?

O mandato do atual Procurador-Geral da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos, se encerra em agosto.

Ao contrário da previsão legal existente para os Ministérios Públicos Estaduais, que estabelece a eleição de uma lista tríplice a ser encaminhada ao chefe do Poder Executivo Estadual, que escolhe o Procurador-Geral de Justiça (chefe do MP Estadual), o cargo de Procurador-Geral da República (chefe do MPF e do MPU) é de livre nomeação pela Presidência da República. Basta ter mais de 10 anos de carreira e ser maior de 35 anos de idade. Após a escolha da Presidência da República, o(a) candidato(a) passa por uma sabatina no Senado Federal e, aprovada a indicação, é feita a formal nomeação:


Constituição Federal > Art. 128. O Ministério Público abrange:
I - o Ministério Público da União, que compreende:
a) o Ministério Público Federal;
b) o Ministério Público do Trabalho;
c) o Ministério Público Militar;
d) o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios;
II - os Ministérios Públicos dos Estados.
§ 1º - O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução.
§ 2º - A destituição do Procurador-Geral da República, por iniciativa do Presidente da República, deverá ser precedida de autorização da maioria absoluta do Senado Federal.
§ 3º - Os Ministérios Públicos dos Estados e o do Distrito Federal e Territórios formarão lista tríplice dentre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que será nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução.
§ 4º - Os Procuradores-Gerais nos Estados e no Distrito Federal e Territórios poderão ser destituídos por deliberação da maioria absoluta do Poder Legislativo, na forma da lei complementar respectiva.


Há cerca de doze anos, a Associação Nacional dos Procuradores da República - ANPR, procurando colaborar para o processo de escolha do PGR e proporcionar maior independência, participação e transparência à escolha, decidiu realizar consultas aos membros do Ministério Público Federal para a formação de uma lista tríplice, encaminhada à Presidência da República a título de sugestão da categoria.

Desde a primeira gestão do Presidente Luis Inácio Lula da Silva e também na atual da Presidenta Dilma Vana Rousseff, a escolha dos membros do Ministério Público Federal tem sido acolhida, tendo a Presidência sempre indicado para PGR o primeiro da lista: Cláudio Lemos Fonteles (2003-2005), Antonio Fernando Barros e Silva de Souza (2005-2007/2007-2009) e  Roberto Monteiro Gurgel Santos (2009-2011/2011-2013).

Assim é que quatro membros do Ministério Público Federal se candidataram a ser avaliados pela classe, em eleição de lista tríplice a ser realizada no dia 17 de abril. Haverá cinco debates entre os candidatos, nas cidades de Brasília (2/4), São Paulo (10/4), Porto Alegre (12/4), Recife (15/4) e Rio de Janeiro (16/4). O Ministério Público Federal não tem nenhuma participação nessas despesas, pois todo o processo é custeado  pela ANPR e pelos próprios candidatos.

Seguem os candidatos e respectivos sites de campanha:

Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, atual Vice Procuradora-Geral da República
www.deborahduprat.com

Ela Wiecko Volkmer de Castilho, atual Ouvidora-Geral do MPF
www.elawiecko.com

Sandra Verônica Cureau, atual Vice Procuradora-Geral Eleitoral
www.sandracureau.com

Rodrigo Janot Monteiro de Barros, Subprocurador-Geral da República
www.rodrigojanot.com

Hoje, a Folha de São Paulo publica entrevistas com Deborah e Ela, que seguem abaixo transcritas. A série de matérias é do respeitadíssimo mestre FREDERICO VASCONCELOS.



Procurador-geral da República precisa dialogar mais, dizem candidatos ao cargo
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FREDERICO VASCONCELOS
DE SÃO PAULO


O próximo procurador-geral da República deverá dialogar mais com a sociedade e redistribuir as atividades e os processos hoje concentrados nas mãos de Roberto Gurgel.


Essa é a expectativa comum dos subprocuradores-gerais Rodrigo Janot, Deborah Duprat, Sandra Cureau e Ela Wiecko, que disputam o cargo de Gurgel. Eles são candidatos à lista tríplice que a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) elegerá no dia 17.

A lista dos três mais votados será enviada à presidente Dilma Rousseff. Nos últimos dez anos, a escolha do procurador-geral respeitou a indicação da categoria.

Nas entrevistas que a Folha publica a partir de hoje, os quatro candidatos criticam a proposta de redução dos poderes de investigação do Ministério Público (PEC 37) e as iniciativas dos senadores alagoanos Renan Calheiros (PMDB) e Fernando Collor (PTB) de desgastar Gurgel.

Eles comentam deficiências do MP no controle externo da polícia e as críticas ao alegado corporativismo do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Os candidatos expõem suas ideias para tornar o Ministério Público Federal mais eficiente e ampliar seu diálogo com os Três Poderes.

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'Há grandes temas a serem postos ao Supremo', diz Deborah Duprat

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FREDERICO VASCONCELOS
DE SÃO PAULO
Se for escolhida para o cargo de Procurador-Geral da República, a prioridade de Deborah Duprat será propor ações que tratem dos direitos humanos e que reflitam "as lutas de vários segmentos sociais".
Procurador-geral da República precisa dialogar mais, dizem candidatos ao cargo
'Gurgel infelizmente ficou muito isolado', afirma Ela Wiecko
"A gente ainda tem um passivo muito grande em termos de direitos humanos. Minha atuação prioritária, não resta dúvida, será nessa área", afirma a candidata.
Sergio Lima/Folhapress
A subprocuradora Deborah Duprat, no Supremo, em 2012
A subprocuradora Deborah Duprat, no Supremo, em 2012
Ela pretende fazer mudanças administrativas internas e reproduzir o que fez nos vinte dias em que atuou na interinidade de Roberto Gurgel, em 2009.
No curto período, ela propôs mais de 30 ações, desengavetou ação sobre aborto de anencéfalos e ajuizou processos, entre outros, sobre a Lei Maria da Penha, Marcha da Maconha, grilagem na Amazônia, transexuais e união homoafetiva.
*
Folha - O MPF está isolado da sociedade?
Eu não acho que o MP está afastado da sociedade. Várias ações mostram uma interlocução permanente. Agora, o fato inegável é que não estamos como naqueles momentos imediatamente posteriores à Constituição de 1988. Não sei se nós, na cúpula, perdemos a interlocução. Vejo trabalhos muito interessantes na base, na primeira instância. Há muito mais identificação com algumas pessoas do que com o conjunto da instituição.
Como deverá ser a interlocução externa do PGR?
Eu proponho uma audiência pública anual para prestação de contas e oitiva da sociedade. Há grandes temas a serem postos perante o STF. Há o papel importante no cargo de PGR na interlocução com os movimentos sociais. Houve períodos de maior e de menor proximidade.
Como vê as pressões contra Gurgel pelos senadores Renan Calheiros e Fernando Collor?
Eu lamento enormemente. Sou a favor das aproximações, e de tentar eliminar ao máximo esses pontos. Acho que há desproporcionalidade, talvez, na reação. No mensalão, Gurgel fez o que lhe caberia fazer. A questão de tom, de oportunidade, como muitos criticam, é pessoal. Ele deve ter lá suas razões. Não vejo nisso qualquer desvio na sua conduta funcional.
Há centralismo na atuação do PGR nas ações penais?
Pretendo mudar completamente. O gasto do gabinete do procurador-geral é extremamente franciscano. É uma característica de seus antecessores também. Minha ideia é ter uma equipe de procuradores trabalhando nesse acervo enorme, de modo a que os processos não tardem. Que saiam no tempo que a lei prescreve.
O que acha do foro privilegiado?
A prerrogativa de foro é uma forma de preservar o cargo, mais do que a pessoa. É o caso do presidente da República. Acho equivocado o entendimento que estende o foro privilegiado para ações de improbidade, porque não há essa previsão na Constituição. As hipóteses de foro privilegiado são extensas. Mas é uma opinião sem nenhuma valia, porque é uma opção do Constituinte. Quanto a isso não há o que fazer.
Acha que a PEC 37 vai passar?
Avalio que não vai passar. Nós teríamos, com certeza, uma impugnação em relação à sua constitucionalidade. Eu fiz o parecer que está no Supremo em relação a várias ações diretas de inconstitucionalidade. Há um dado muito interessante, a partir da jurisprudência das cortes internacionais de direitos humanos. A partir do momento em que o Estado toma para si o monopólio da punição, ele tem a obrigação de investigar e dar uma resposta célere e eficaz às vítimas. Não existe racionalidade em colocar um único órgão responsável por essa tarefa.
O MP deve comandar as investigações?
Não se trata disso. O MP pode e deve investigar. Não é o único que tem essa legitimidade. Como também a polícia não deve ser a única. Não é só o MP que vai ser afetado se a PEC 37 passar. Nós temos uma quantidade de órgãos que investigam. A investigação criminal tem que estar a cargo de mais de um órgão.
O MPF deve dispor de equipamentos de interceptação telefônica?
Eu ainda não tenho clareza a respeito. O MP pode ter equipamentos. Se vier a fazer interceptação terá que ter autorização judicial. Isso ainda não é uma ideia bem organizada dentro da procuradoria-geral. Tem que ter servidores habilitados. É um planejamento muito mais amplo do que a mera ideia de ter o equipamento.
O Ministério Público faz um bom controle externo da Polícia?
Não. Há um exercício para melhorar. A câmara setorial, de natureza penal, produziu um manual de orientação. Mas eu vejo ainda precariedades nessa área. Nossa prática está aquém das nossas possibilidades.
Como avalia a atuação do Conselho Nacional do Ministério Público? O órgão é criticado, sob a alegação de não ser rigoroso em relação a casos de inépcia de procuradores e promotores.
Não, não. As corregedorias estão atuando, estão produzindo relatórios, processos disciplinares. Nós tivemos casos até bastante significativos, como a instauração do processo administrativo contra o Demóstenes [procurador de Justiça e ex-senador Demóstenes Torres], o Bandarra [Leonardo Bandarra, ex-procurador-geral de Justiça do Distrito Federal, afastado em 2011]. Como todo órgão novo, caminha na busca de encontrar sua identidade. Eu não tenho esse sentimento de proteção das corporações. O fato de ser um conselho plural, com vários segmentos representados, neutraliza um pouco eventuais pressões corporativas.
Como vê a questão salarial?
De fato, ela conta com uma defasagem. Nós temos mandados de injunção, mostrando que ao longo do tempo não houve a recomposição determinada pela Constituição. Isso tem um reflexo direto na atividade, porque começa a afastar do MP algumas pessoas extremamente competentes, habilitadas. Os concursos começam a ter uma concorrência cada vez menor.
Há críticas à falta de transparência do MP em relação aos benefícios, como auxílio-alimentação, auxílio-moradia etc. Como avalia a questão?
Não com relação ao MPF, que é franciscano, paga tão pouco... Estamos pouco preparados para a lei de acesso à informação. Temos dificuldade de organizar e disponibilizar as informações. Não é uma caixa-preta. Nossas portarias de pagamento de auxílio-moradia são públicas.

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'Gurgel infelizmente ficou muito isolado', afirma Ela Wiecko

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FREDERICO VASCONCELOS
DE SÃO PAULO
A subprocuradora-geral Ela Wiecko, canditada ao cargo de Procurador-Geral da República, acha que o Ministério Público Federal não faz um controle externo eficiente da Polícia Federal.
Procurador-geral da República precisa dialogar mais, dizem candidatos ao cargo
'Há grandes temas a serem postos ao Supremo', diz Deborah Duprat
"O MPF tem se empenhado muito. Ele encontra muita dificuldade, porque a Polícia Federal questiona. É uma área de atrito, uma área difícil. Nós assumimos isso", diz Wiecko.
Divulgação
A subprocuradora-geral da República Ela Wiecko
A subprocuradora-geral da República Ela Wiecko
Ela diz que o mote de sua campanha é "fazer juntos". "Quero fazer uma administração realmente participativa. A minha história, em todos os lugares que exerci a função dentro da procuradoria, mostra isso".
*
Folha - O MPF está isolado da sociedade?
Isolado, ele não está. Fui corregedora e, agora, como ouvidora, recebo manifestações de confiança no MPF. Por outro lado, achar que esse diálogo é tranquilo, que as pessoas têm clareza, não. Mas isolado, não.
Como garantir maior protagonismo político do PGR?
De uns tempos para cá, o procurador-geral não tem sido aquela pessoa que a imprensa procura para saber sua opinião sobre temas candentes. Deveria se manifestar mais sobre, por exemplo, segurança pública, política criminal. O PGR tem muitas funções importantíssimas. Tem que se organizar com pessoas de confiança que o assessorem e que o informem. O PGR tem que se aproximar das universidades, onde as pessoas estão pensando, fazendo pesquisas, elas podem agregar dados, reflexões.
Qual a avaliação da gestão de Roberto Gurgel?
Ele demorou muito para começar o planejamento estratégico. No momento em que ele escolheu o secretário-geral, Lauro Pinto Cardoso, melhorou muito essa administração. Mas na parte de articulação interinstitucional, em relação a outros MPs, ao Legislativo e ao Executivo, parece que ele não tem essas pessoas que ajudem nisso.
Como vê as pressões contra Gurgel pelos senadores Renan Calheiros e Fernando Collor?
Eu não tenho informação suficiente para responder por que isso está acontecendo. Como o cidadão comum está vendo isso? Há uma visão geral. O MP realmente está sofrendo o jogo do poder. A gente tem aquele poder de oferecer denúncia. Isso está sendo feito em todo o Brasil. Isso tem a ver com esse esforço de apontar o que existe de improbidade, de crimes. Acho que faz parte desse contexto político.
Como vê a crítica de que há centralismo na atuação do PGR nas ações penais? Pretende distribuir mais os processos?
Com certeza. As propostas de todos nós, me parece, são exatamente de reestruturar um projeto estratégico para a PGR. Sem dúvida nenhuma. O dr. Gurgel, infelizmente, não sei exatamente porquê, ficou muito isolado. Às vezes, é um perfil pessoal.
O que acha do foro privilegiado?
Pragmaticamente, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça são tribunais que não têm condições para fazer esse trabalho de instrução [obter provas e efetuar diligências].
Acha que a PEC 37 vai passar?
Não tenho uma bola de cristal. Acho que há uma boa possibilidade de não passar. Está havendo toda essa movimentação da sociedade civil organizada. Esse substitutivo, que não foi aprovado, voltado para o radicalismo, faz parte desse jogo político. Amarrar muito o MP talvez não seja a melhor solução. Tem que esperar para ver.
A sra. acha que o MP deve comandar a investigação?
Sim.
O MPF deve dispor de equipamentos de interceptação telefônica?
Trata-se de questão extremamente controvertida. Igualmente, a questão de uma estrutura de perícia criminal. Se for escolhida, debaterei o tema internamente para identificar se não é melhor, ao menos em um primeiro momento, incrementar a relação institucional com a Polícia Judiciária, de modo a permitir um acompanhamento direto pelo MPF dessas escutas.
O Ministério Público faz um bom controle externo da polícia?
Não. Sobre os MPs dos Estados eu não posso falar muito, mas pelas outras coisas que eu sei, acho que não faz. O MPF tem se empenhado muito, tem manual. Ele encontra muita dificuldade porque a Polícia Federal questiona. É uma área de atrito, uma área difícil. Nós assumimos isso. Tem uma clara política nesse sentido.
Como avalia a atuação do Conselho Nacional do Ministério Público?
Vou falar a partir da minha experiência como corregedora. O CNMP, talvez naquela ânsia de ficar numa posição de relevo, de dar uma resposta como o CNJ estava dando, começou a pressionar muito as corregedorias. [Surgiram] várias regulamentações. Aí, acontece um tipo de padronização que não atende às especificidades dos MPs. Tem um lado bom, que tenho ouvido como corregedora. O Conselho está buscando mudanças na estrutura naqueles MPs que estão mais "atrasados", que não têm sistemas. O CNMP quer relatórios. Como se vai gerar esses relatórios se os MPs não têm analistas de informática, não têm uma plataforma boa? Mas está fazendo com que os MPs se atualizem e se modernizem. Eu tenho uma avaliação positiva/negativa, ao mesmo tempo.
Como avalia a questão salarial do MPF?
Essa é uma questão está incomodando demais a todos os membros do MP e do Judiciário. E aí tem um diz-que-diz, cada um olha para o outro, dizendo que o outro ganha mais. Teria que haver uma simetria. Eu, com quase 40 anos de MP, ganho 10% a mais de quem entra. Realmente, a pessoa que entra está feliz. Quem fica mais um tempo vê que as coisas não estão legais. O nosso salário, realmente, tem que ser um salário que nos dê condições de exercer as funções de fiscal da lei de forma imparcial. Quando a gente olha na base, vê que a gente está ficando para trás.
Há várias críticas à falta de transparência do MP em relação aos benefícios como auxílio-alimentação, auxílio-moradia etc. Como avalia a questão?
No caso do MP da União tem o portal da transparência, todos sabem quanto eu ganho. Não há mistério nenhum. A questão remuneratória é muito importante, mas está sendo tratada de uma forma que não é a melhor. Cada um acha que o outro está escondendo, no bolso do colete. Talvez se pudesse abrir o debate amplo, sincronizado, comparando as várias carreiras no Executivo, no Legislativo.
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PGR precisa dialogar mais, dizem os candidatos:

Deborah:

Ela:

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