sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Embargos nos embargos nos embargos....

Minha mesa, dia desses...
A morosidade no efetivo cumprimento das decisões judiciais passa pela possibilidade praticamente infinita de recursos, que podem procrastinar, protelar, atrasar a solução do feito por meses ou anos.

Um dos expedientes mais utilizados para essa finalidade chama-se "Embargos de Declaração", um recurso que é interposto quando a parte achar que há ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão na decisão proferida.

Nos tribunais são muito usados, também, os "Embargos Infringentes" (quando a decisão colegiada não é unânime - na área criminal é recurso privativo do réu, não permitido ao Ministério Público),  "Embargos de Nulidade" e "Embargos de Divergência".

Não há limite para a interposição esses recursos.

Transcrevo abaixo o desabafo de uma Ministra do STJ, em artigo escrito por seu assessor. Fui uma das que trabalhou no caso mencionado e seu andamento pode ser acompanhamento aqui: http://www.stj.jus.br/webstj/processo/Justica/detalhe.asp?numreg=200600587316&pv=010000000000&tp=51

A denúncia foi oferecida em outubro de 2003 e recebida, por unanimidade, em dezembro de 2003. A ação penal foi julgada em dezembro de 2004 pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

Após os recursos cabíveis perante o TRF, o processo chegou ao STJ - Superior Tribunal de Justiça em março de 2006. Os recursos das partes foram julgados em fevereiro de 2008.

Graças aos inúmeros Embargos (perdi a conta, acho que foram 5 ou 6, sucessivos), até agora a decisão não se tornou definitiva, ou, como se diz na linguagem jurídica, não transitou em julgado.

Previsão para conclusão de tudo? Nenhuma. Ainda pode haver recursos ao Supremo Tribunal Federal...




Embargos nos embargos, nos embargos etc.


Em artigo publicado no site “Consultor Jurídico“, Marcos Aurélio Pereira Brayner, assessor de ministro do Superior Tribunal de Justiça, trata do excesso de recursos como forma de postergar a conclusão da ação penal para alcançar a prescrição, o que leva à impunidade de condenados por crimes graves.

“Conquanto seja legítima, a priori, a convalidação da impunidade pela prescrição, não se pode admitir a subversão desse instituto, permitindo que vias procrastinatórias de defesa, que contam com a complacência do processo penal, sejam usadas como atalho para se alcançar a impunidade indesejada”, afirma o autor.

“Os operadores do Direito na seara penal, mesmo os incipientes, percebem rapidamente como, em muitos casos, a busca pela prescrição se tornou uma das principais estratégias de defesa, trilhando uma via inescrupulosa para livrar o criminoso da punição neste país”.

Segundo o articulista, “parece haver uma letargia do Poder Legislativo, que não se movimenta para alterar as normas que permitem a malversação dos recursos do processo penal, em muitos casos, abusivamente utilizados para postergar a conclusão da ação penal, até a obtenção da declaração de extinção da punibilidade pela prescrição”.

Ele observa que inexiste no anteprojeto do novo Código Penal proposta para alterar o regime da prescrição .

A título de exemplo, descreve o que aconteceu com processo da Operação Anaconda, citando comentário da ministra Laurita Vaz nos autos:

“É frustrante ver a quantidade de horas de trabalho de tantas pessoas, inclusive o meu próprio, ser jogado no lixo, por regras de prescrição tão complacentes, com prazos tão exíguos, a beneficiar réus condenados por crimes extremamente graves.”

E prossegue o articulista: “É digno de nota a quantidade de petições e recursos atravessados apenas no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, que renderam, só da relatora do recurso especial (*), 26 despachos, 6 decisões monocráticas e 10 relatórios e votos. Hoje, passados mais de 10 anos dos fatos supostamente criminosos, ainda pende de julgamento Embargos de Divergência naquela Corte Superior — recurso redistribuído para outro relator da 3ª Seção –, afora os recursos extraordinários também já interpostos”.

O autor conclui: “Ao réu deve ser garantido o livre exercício do direito à ampla defesa e ao contraditório, observado o devido processo legal, garantias fundamentais consagradas na Constituição Federal. Sem embargo, como todo e qualquer direito, não é absoluto, nem, tampouco, pode servir para, por vias oblíquas, legitimar a impunidade, mormente quando alcançada às custas da incessante interposição de recursos protelatórios”.
(*)  Recurso Especial 827.940/SP

http://blogdofred.blogfolha.uol.com.br/2012/10/18/embargos-nos-embargos-nos-embargos-etc/



terça-feira, 9 de outubro de 2012

Acessibilidade zero: Eleitora é impedida de votar

Hoje vou contar um caso real, que aconteceu aqui em São Paulo.

Uma querida amiga da mamãe e minha, que legalmente está dispensada de votar por ter mais de 70 anos, com toda a legitimidade quis ir às urnas exercer plenamente a sua cidadania, para ajudar a escolher, com seu voto, quem irá  legislar na Câmara de Vereadores e quem irá governar a cidade.

Há cerca de duas semanas, nossa amiga teve uma pequena fratura no fêmur e está com enorme dificuldade de locomoção, embora temporariamente. Apesar das fortes dores, tem conseguido andar alguns passos com o auxílio de bengala.

Chegando ao local de votação, ela verifica que não há rampas, elevadores ou qualquer requisito de acessibilidade. Sua Seção de votação localiza-se no andar de cima de uma escola pública no bairro da Vila Prudente.

Os responsáveis pela supervisão local, nem sempre bem capacitados, dizem que nada podem fazer. Justamente indignada, ela pergunta se não há previsão legal de uma urna no térreo, para idosos ou pessoas impossibilitadas de subir escadas. Ninguém sabe informar. Ela pede, então, que seja lavrada a justificativa e os responsáveis recusam, sob a alegação de que, como ela não é obrigada a ir votar, a medida é igualmente desnecessária.

Direitos humanos, cidadania, respeito ao eleitor: é a nossa praia... certamente há algo que o Ministério Público Eleitoral possa fazer!!

Decidi fazer uma representação formal comunicando o fato ao Procurador Regional Eleitoral do Estado de São Paulo, Doutor André de Carvalho Ramos.

Foto: http://wvats.cedwvu.org/newsletters/index.php
Primeiramente, as escolas, como todo prédio público, têm que ser adaptadas à acessibilidade - e não é só para realização de eleições, não. É obrigação que decorre de lei. Levantamento do TRE/SP em 2010 constatou que apenas cerca de 35% das escolas públicas têm acessibilidade e, nisso, os governos (municipais, estaduais e federal) estão descumprindo a lei.

A legislação eleitoral prevê que pessoas com impossibilidade de locomoção requeiram a mudança da Seção Eleitoral, para uma que seja em local acessível. Só que esse prazo, salvo engano meu, termina em maio, ou seja, meses antes das eleições. E os eleitores que sofrerem um acidente, uma queda ou uma cirurgia após esse prazo? Ficam privados do seu direito ao voto pela incompetência dos governos de não tornar seus prédio públicos acessíveis?

O Ministério Público Eleitoral em SP tem se dedicado à garantia do pleno exercício do direito ao voto. Por iniciativa do MP, por exemplo, é que se assegurou fosse observado o preenchimento do mínimo de  30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo e, também, que os presos provisórios e os menores infratores com mais de 16 anos pudessem votar.

A Procuradoria Regional Eleitoral em SP pediu diversas providências à Justiça Eleitoral em relação às pessoas com dificuldade de locomoção, em anos anteriores.

Em janeiro de 2012, expediu Recomendação a todos os Promotores Eleitorais, para que fiscalizassem as condições de acessibilidade, além de outras providências. Você pode ler todos os pedidos da PRE/SP aqui:
http://www.presp.mpf.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=674&Itemid=72

Por todas essas razões, vou comunicar o fato à Procuradoria Regional Eleitoral.

Se você passou pelo mesmo problema, ou teve qualquer outro durante a votação no Estado de São Paulo, comunique ao Ministério Público:

a) por telefone (11 4003-0278 para a Capital e região metropolitana ou 0800-8810278 para as demais localidades),

b) por carta (Av. Brigadeiro Luís Antônio, 2.020 - 4º andar - Bela Vista - São Paulo/SP
CEP 01318-002 ) ou

c) pelo site da PRE/SP: http://www.presp.mpf.gov.br/denuncia/



Nos demais Estados, para denunciar qualquer irregularidade, procure os canais de comunicação com o Ministério Público Eleitoral aqui: http://www.eleitoral.mpf.gov.br/servicos/denunciar

Com base nas informações fornecidas pelos eleitores, a Procuradoria Regional Eleitoral poderá tomar providências e tentar resolver esses impasses – se não para o segundo turno, para o próximo pleito!