Na semana passada, realizou-se o 28º Encontro Nacional dos Procuradores da República, promovido anualmente pela ANPR - Associação Nacional dos Procuradores da República.
Neste ano, o tema do encontro foi O Ministério Público Federal e os Desafios da Segurança Pública. Foram realizados diversos painéis de trabalho (mesmo com aquele sol maravilhoso, o mar, a piscina, o bar e o chamado da natureza linda de Caucaia, cerca de 35 km de Fortaleza...) e tivemos como palestrantes convidados:
1) Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e Secretário da Segurança Pública do Rio de Janeiro José Mariano Beltrame;
2) Gilda Carvalho, Subprocuradora-Geral da República e Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão e Paula Bajer Fernandes Martins da Costa, Procuradora Regional da República e Coordenadora do Grupo de Trabalho do Sistema Prisional;
3) Conselheiros do CNMP - Conselho Nacional do Ministério Público: Thaís Schilling Ferraz (Juiza Federal), Almino Affonso (Advogado) e Mário Luiz Bonsaglia (Procurador Regional da República-MPF);
4) Wálter Fanganiello Maierovitch, jurista, desembargador aposentado do TJ/SP, professor, colunista do Portal Terra (http://maierovitch.blog.terra.com.br/) e da Rádio CBN.
Na sexta-feira, 5, durante toda a manhã debatemos temas relativos à segurança pública e criminalidade, resultando na elaboração da Carta de Caucaia, aprovada, à tarde, pela Plenária formada por todos os participantes e que segue abaixo transcrita. É a contribuição do Ministério Público Federal para a melhoria da Segurança Pública.
XXVIII Encontro Nacional dos Procuradores da República
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E OS DESAFIOS DA SEGURANÇA PÚBLICA
Carta de Caucaia – CE
Os membros do Ministério Público Federal, reunidos no Município de Caucaia‐CE, no XXVIII Encontro Nacional dos Procuradores da República, ocorrido entre os dias 1º e 5 de novembro de 2011, em torno do tema central “O Ministério Público Federal e os Desafios da Segurança Pública”;
CONSIDERANDO que o Direito Penal tem a função também de
proteção dos direitos humanos da coletividade, pois as garantias
fundamentais envolvem não apenas as dos investigados e dos
réus, mas também aquelas correlatas aos interesses sociais.
CONSIDERANDO, ainda que, por seus poderes e órgãos
constituídos, é dever fundamental do Estado a prestação de
jurisdição eficiente de modo a garantir também a segurança
pública e valorizar a cidadania.
CONCLUEM, a partir destas premissas, que:
1) a nova Lei de Medidas Cautelares (12.403/2011) traz modernas
regras como alternativas à exclusiva prisão ou liberdade, porém é
fundamental que o Estado adote as medidas mais adequadas de
forma a evitar a insegurança pública e a desproteção jurídica;
2) o Estado deve constituir um banco nacional de medidas
alternativas à prisão e adquirir imediatamente equipamentos para
viabilizar a vigilância eletrônica, com o fim de permitir a
efetividade da Lei 12.403;
3) reconhece‐se como relevante e fundamental para dar maior
eficiência ao sistema recursal brasileiro a aprovação da Proposta
de Emenda Constitucional nº 15/2011 (PEC dos Recursos);
4) apoia‐se a aprovação do PL 3443/2008, que aprimora a Lei de
Lavagem de Dinheiro;
5) é necessário melhor aparelhamento do Estado para combate ao
crime organizado, bem assim a melhor definição do tipo do delito
de organização criminosa e a regulamentação das técnicas
especiais de investigação (PL 6.578/2009);
6) repudia‐se o teor do PLS 354/2009 e do PL 5.228/2005, que
geram anistia criminal de condutas relacionadas a bens e direitos
ocultados anteriormente ao Estado;
7) é fundamental que seja instituída, por lei, a Política Nacional de
Segurança Pública (PNSP), a ser executada, nos três níveis da
federação, pelos órgãos do Sistema Nacional de Segurança Pública
e Justiça Criminal, com controle social e participação necessária do
Ministério Público;
8) na Política Nacional de Segurança Pública, é necessário um
pacto federativo envolvendo os Poderes constituídos e o
Ministério Público, com a meta de reduzir os índices de crimes
violentos letais intencionais a patamares considerados nãoepidêmicos
pela ONU (abaixo de 10 homicídios por 100.000
habitantes);
9) deve haver estímulo a políticas públicas que também sirvam
para a prevenção da prática de crimes;
10) a União deve estabelecer padrão nacional de estatística dos
crimes violentos letais intencionais, abarcando especialmente os
autos de resistência;
11) deve haver implementação e modernização de unidades de
perícia criminal em todo o Brasil;
12) deve ser implementada política de melhoria das condições dos
presídios, de forma a garantir a dignidade dos presos; de outro
lado, deve haver ampliação e maior rigor do Regime Disciplinar
Diferenciado (RDD) para os casos de criminosos de alta
periculosidade, em especial para líderes de organizações
criminosas;
13) o Brasil deve dedicar maior esforço ao cumprimento das
convenções internacionais em matéria criminal, particularmente
os mandados de criminalização das Convenções de Palermo (crime
organizado) e de Mérida (corrupção);
14) como forma de aprimorar a persecução e cooperação em crimes
cibernéticos, o Brasil deve criar mecanismos como aqueles
previstos na Convenção de Budapeste (2001), aprovar o PL 84/1999
e o PL do Marco Civil da Internet;
15) especialmente no momento em que o Brasil se destaca no
contexto político‐econômico global com a organização de
megaeventos desportivos, torna‐se ainda mais urgente fixar o
marco normativo e tipificar as condutas de terrorismo,
financiamento ao terrorismo e participação em organização
terrorista;
16) o Procurador‐Geral da República deve ser a autoridade central
nos procedimentos de cooperação jurídica internacional em
matéria penal, especialmente em virtude do disposto no artigo 129
da Constituição;
17) o Brasil deve dar cumprimento automático aos mandados
internacionais de prisão, veiculados pela Interpol (com posterior
análise do STF), a fim de não permitir que o País seja refúgio para
criminosos;
18) é importante que o Brasil internalize o Acordo de Foz de
Iguaçu (2010), que criou o “mandado do Mercosul de capturas”;
19) o Brasil deve propor a regulamentação, no âmbito do Mercosul
e da Unasul, da cooperação penal direta em áreas de fronteira para
atos de comunicação processual e obtenção de provas de delitos
transnacionais;
20) a União deve priorizar os recursos humanos e financeiros em
atividades de inteligência e operações de fiscalização nas
fronteiras, inclusive com o uso das Forças Armadas, nas hipóteses
legais; também, mediante convênios com os Estados, deve ser
estimulada a implantação de unidades policiais em áreas de
fronteira;
21) o Brasil deve tipificar o delito de conspiração, como forma de
reprimir a prática de crimes graves detectados ainda na fase
preparatória;
22) é fundamental que sejam excluídas do ordenamento jurídico a
prescrição retroativa (que existe somente no Brasil) e a
intercorrente, que estão entre as principais causas de impunidade;
23) devem ser ampliadas as possibilidades de resolução
consensual no processo penal, permitindo a realização de acordos
pelo Ministério Público para a aplicação imediata de penas, nos
termos do procedimento sumário previsto no PLS 156/2009;
24) o Programa Nacional de Proteção às Vítimas e Testemunhas
Ameaçadas deve ter aprimoramento legislativo, com garantias
orçamentárias, profissionalização da gestão e efetiva participação
do Ministério Público na União e nos Estados;
25) os institutos despenalizadores não podem ser aplicados a
delitos graves, devendo haver uma readequação das penas de
forma proporcional à gravidade dos delitos;
26) reafirma‐se que o Ministério Público tem poder de investigação
criminal, confiando em que o Plenário do Supremo Tribunal
Federal o reconhecerá;
27) é necessário que o Poder Judiciário, notadamente os tribunais
superiores, considere com mais atenção os interesses coletivos na
jurisprudência penal, de modo a não gerar proteção deficiente do
interesse público.
28) os procuradores da República reafirmam sua confiança no
CNMP, manifestada antes mesmo de sua criação, certos de que
este Conselho não excederá de suas atribuições constitucionais
para imiscuir‐se na atividade‐fim do órgão ministerial, o que lhe é
peremptoriamente vedado, conforme já reconheceu o próprio
Conselho;
29) os procuradores da República apoiam a indicação das
Subprocuradoras‐Gerais da República Deborah Macedo Duprat de
Britto Pereira Duprat e Ela Wiecko Volkmer de Castilho para o
Supremo Tribunal Federal pois, além de reconhecida e honrosa
atuação em todas as áreas do Direito, têm conhecimento e domínio
na seara penal e processual penal, indispensável para que a Corte
Constitucional aprimore o tratamento desses temas;
30) a política nacional de segurança pública e justiça criminal
depende da valorização das carreiras envolvidas na investigação,
persecução e execução penal, e o Ministério Público, como titular
privativo da ação penal, é instituição essencial e indispensável ao
controle da criminalidade;
31) é necessário enfatizar que o Estado deve fornecer garantias –
inclusive físicas – aos membros do Ministério Público e do
Judiciário para o adequado desempenho de suas atribuições
constitucionais, sob pena de, na inércia, ocorrerem novos casos
como o do Procurador da República Pedro Jorge e da Juíza Patrícia
Acioli;
32) é imprescindível, também, que o Estado implemente política
remuneratória digna para as magistraturas do Ministério Público e
do Poder Judiciário, compatível com suas prerrogativas e
inúmeras responsabilidades. A diminuição gradativa do poder
aquisitivo dessas magistraturas constitui indiscutível estratégia de
esvaziamento de seus quadros e desestímulo à sua atuação
cotidiana.
A Associação Nacional dos Procuradores da República
permanecerá mobilizada no aprimoramento da segurança pública
e na defesa das prerrogativas de todos os membros da Instituição,
bem como na busca da recomposição de perdas inflacionárias
sofridas ao longo dos últimos anos e no reconhecimento desta
necessidade.
Caucaia, 3 de novembro de 2011.
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