segunda-feira, 25 de março de 2013

Autocandidaturas ao STF e a ausência de critérios de escolha

Foto: Douglas Fischer
Quer ser Ministro do Supremo Tribunal Federal?

Como se fosse um emprego qualquer, anunciado nos classificados dos jornais, envie curriculum vitae com foto 3 x 4, insista com o 'empregador' e marque uma entrevista. Depois, saia por aí dizendo que esteve no Palácio do Planalto 'a pedido': isso valoriza o seu passe (o pedido foi seu, mas não precisa contar).

Matéria genial do repórter Felipe Recondo, do O Estado de São Paulo, mostra como anda despida de qualquer critério objetivo a escolha de alguém para ser um dos 11 que têm a última palavra nos julgamentos em todo o País.

A Constituição Federal (artigo 101) impõe poucos requisitos - na verdade, apenas três - para o preenchimento do mais alto cargo do Poder Judiciário: idade entre 35 e 65 anos, notável saber jurídico e reputação ilibada.


Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.
Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.


O nome é indicado livremente pela Presidência da República e o(a) candidato(a) submete-se a uma sabatina no Senado Federal. Com a aprovação no Senado, a Presidência da República efetiva a nomeação. Na prática, a sabatina do Senado Federal passa ao largo de uma verificação séria, técnica e responsável dos requisitos relativos ao saber jurídico e à reputação ilibada.

Há muitos anos esse modelo de escolha dos Ministros do Supremo Tribunal Federal tem sido motivo de preocupação pela cidadania, razão pela qual tem recebido severas críticas da comunidade jurídica. A ausência de critérios objetivos é absoluta e deixa a indicação ao livre alvitre da Presidência da República, em total opacidade.

Esse excesso de discricionariedade concedido pela Constituição à Presidência da República na nomeação dos Ministros do STF pode acabar resvalando no franco apadrinhamento de aliados políticos como único requisito - e esse jamais é revelado aos cidadãos. Transparência zero.

O cargo de Ministro do STF é vitalício. Há propostas de alteração constitucional sugerindo mudanças na forma de escolha, nos requisitos necessários ao preenchimento de tão alto cargo e estabelecendo prazo de permanência. Voltaremos ao tema em outra oportunidade, analisando essas propostas.

Por ora, o repórter Felipe Recondo bem que poderia publicar a lista dos autocandidatos, não?



Candidatos fazem peregrinação por vaga no Supremo

Cerca de 40 pretendentes já se apresentaram para o posto de Ayres Britto, que se aposentou em meio ao julgamento do mensalão

25 de março de 2013 | 2h 06
FELIPE RECONDO / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo
O processo de escolha do novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) esvazia uma frase repetida há mais de um século nos meios jurídicos: cargo de ministro do Supremo não se pleiteia nem se recusa. Pelas contas de integrantes do governo, mais de 40 nomes já se apresentaram em busca da vaga, e a maioria é de candidatos de si mesmos. Eles se aventuraram a disputar a cadeira deixada no ano passado pelo ministro Carlos Ayres Britto, que se aposentou em meio ao julgamento do mensalão.
São presidentes de tribunais estaduais, juízes federais e estaduais, advogados, procuradores da República, integrantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ministros de tribunais superiores que seguem diferentes caminhos, alguns mais discretos, outros nem tanto (ver matéria ao lado), mas todos com o objetivo único: a unção da presidente da República, Dilma Rousseff.
Um dos integrantes dessa relação é o presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES), Pedro Valls Feu Rosa. "Fui convocado a colocar meu nome à disposição do Brasil em função de consenso dos meus pares no TJ-ES, do chefe do Poder Executivo Estadual - governador Renato Casagrande (PSB) - e dos membros da bancada federal capixaba", revelou o magistrado.
A peregrinação desses candidatos tem como destino os gabinetes do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, do secretário-executivo da Casa Civil, Beto Vasconcelos, do secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Flávio Caetano, do subchefe para Assuntos Jurídicos, Ivo da Motta, e do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.
Fora do Executivo e das proximidades palacianas, o gabinete do ministro do STF Ricardo Lewandowski tem recebido sucessivos pedidos de audiência desde o final do ano passado. Muitos apostam que ele terá influência na escolha do novo ministro. Mesmo que ouçam o contrário do próprio Lewandowski.
O Estado pediu ao Ministério da Justiça, à Casa Civil e à Advocacia-Geral da União a lista de pessoas que pediram audiências para falar especificamente da vaga aberta no Supremo. No total, são 22 nomes de pessoas que se ofereceram para a vaga.
Somam-se a essa relação outros candidatos já mencionados em outras disputas. Seus nomes não constam dessas listas, mas alguns deles já procuraram por ministros do STF. Alguns argumentam que ministros do Supremo não indicam, mas podem até vetar nomes para a Corte. Nesse grupo estão conselheiros do CNJ, ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), desembargadores de tribunais de justiça, juízes federais e procuradores da República.
Problemas. Integrantes do governo afirmam que a estratégia de se colocar à disposição para a vaga no STF não chega a ser um pecado. Às vezes, disse um deles, até ajuda a conhecer nomes que eventualmente poderiam ser sabatinados para a vaga.
Quando, em 2011, a presidente Dilma Rousseff quis indicar uma mulher para a Corte, os assessores tiveram de analisar os nomes de todas as desembargadoras dos tribunais de todos os Estados e fazer uma lista com nomes palatáveis. Ao final, chegaram a quatro nomes. A ministra Rosa Weber, na época no Tribunal Superior do Trabalho (TST), foi a escolhida.
A campanha começa a tornar-se um problema quando o candidato busca apoio político. O risco apontado é de o pretendente começar a assumir dívidas ou compromissos políticos. A ajuda que vem num primeiro momento pode tornar-se uma dívida a ser cobrada.


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