quarta-feira, 13 de junho de 2012

Fernando Pessoa, Lisboa, 13 de junho de 1888.



Há 124 anos nascia em Lisboa, o meu poeta do coração: Fernando António Nogueira Pessoa.
Além de Pessoa - ele mesmo, o incomparável poeta e escritor português deu vida a vários heterônimos, sendo os mais conhecidos Alvaro de Campos, Ricardo Reis, Bernardo Soares (que escrevia em prosa) e - difícil escolher! - o meu preferido, Alberto Caieiro.

Alguns de seus poemas e frases são bastantes populares ("O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente / Que chega a fingir que é dor / A dor que deveras sente").

Trago aqui fragmentos dessa vastíssima obra, essa criação tão grandiosa que é o ortônimo e seus heterônimos - Fernando Pessoa e seus outros eus.

Liberdade
Ai que prazer
Não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
Como tem tempo, não tem pressa…

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças…
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca…
Fernando Pessoa, "Cancioneiro"


O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás…
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem…
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras…
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do mundo…

Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender…

O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo…

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos…
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar…
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar…

Alberto Caieiro, "O Guardador de Rebanhos", II


Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples
Tem só duas datas — a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra cousa todos os dias são meus.

Sou fácil de definir.
Vi como um danado.
Amei as cousas sem sentimentalidade nenhuma.
Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.
Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.
Compreendi que as cousas são reais e todas diferentes umas das outras;
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.
Fechei os olhos e dormi.
Além disso, fui o único poeta da Natureza.

Alberto Caeiro, "Poemas Inconjuntos"

Paisagem da chuva
Toda a noite, e pelas horas fora, o chiar da chuva baixou. Toda a noite, comigo entredesperto, a sua monotonia fria me insistiu nos vidros. Ora um rasgo de vento, em ar mais alto, açoitava, e a água ondeava de som e passava mãos rápidas pela vidraça; ora um som surdo só fazia sono no exterior morto. A minha alma era a mesma de sempre, entre lençóis como entre gente, dobrosamente consciente do mundo. Tardava o dia como a felicidade e àquela hora parecia que tardava indefinidamente.
Se o dia e a felicidade nunca viessem! Se esperar, ao menos, pudesse nem sequer ter a desilusão de conseguir.
O som casual de um carro tardo, áspero a saltar nas pedras, crescia do fundo da rua, estralejava por baixo da vidraça, apagava-se para o fundo da rua , para o fundo do vago sono que eu não conseguia de todo. Batia, de quando em quando, uma porta de escada. Às vezes havia um chapinhar líquido de passos, um roçar por si mesmas de vestes molhadas. Uma ou outra vez, quando os passos eram mais, soava alto e atacava. Depois o silêncio volvia, com os passos que se apagavam, e a chuva continuava, inumeravelmente.
Nas paredes escuramente visíveis do meu quarto, se eu abria os olhos do sono falso, boiavam fragmentos de sonhos por fazer, vagas luzes, riscos pretos, coisas de nada que trepavam e desciam. Os móveis, maiores do que de dia, manchavam vagamente o absurdo da treva. A porta era indicada por qualquer coisa nem mais branca, nem mais preta do que a noite, mas diferente. Quanto à janela, eu só a ouvia.
Nova, fluida, incerta, a chuva soava. Os momentos tardavam ao som dela. A solidão da minha alma alargava-se, alastrava, invadia o que eu sentia, o que eu queria, o que eu ia a sonhar. Os objectos vagos, participantes, na sombra, da minha insónia, passavam a ter lugar e dor na minha desolação.

Bernardo Soares, "Livro do Desassossego" 



2 comentários:

  1. Excelentíssima Procuradora da República Janice.

    Fernando Pessoa é Fernando Pessoa.

    Nobre Procuradora, continua sendo a notável professora, a qual tive a honra de assistir as lições no curso preparatório ao Exame de Ordem, realizado no início da Rua Boa Vista (P. do Colégio).

    Hoje, Procuradora. Eu, Juiz do Trabalho Substituto.

    Abs.

    Paulo César - saintpaulcaesar26@bol.com.br

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  2. Olá,nossa adoro esse blog,só tem artigo bom,sempre que dá estou passando aqui,depois que meu amigo me recomendo nunca mais deixei de visitar,alguem sabe me falar se assim aqui é bom www.softwarecelularespiao.org ? abraços,assim que der eu volto pra comentar aqui no blog

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